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Muita Leitura. Sempre!
Ler, sempre, de preferência nas mais diversas áreas de conhecimento, indubitavelmente é um potente
"combustível" para o nosso aprimoramento intelectual. Eis a razão desta seção de publicação de resenhas sobre livros. Ela
não deve ficar a cargo apenas dos componentes do Nepet. Ao contrário, deve ser um fórum onde todos possam nos brindar com
as mais variadas contribuições através de relatos e informações que emprestem à leitura um forte componente para alimentar
as reflexões na educação tecnológica.
(As resenhas são feitas a partir do original que foi lido.)
Contestação: Nova fórmula de ensino
Neil Postman e Charles Weingartner | RJ | Expressão Cultural | 275p. | 1971
Resenha | Clayton Barbosa Ferreira Filho e Larissa Zancan Rodrigues | PPGECT | UFSC
Contestação: Nova fórmula de ensino
Neil Postman e Charles Weingartner | RJ | Expressão Cultural | 275p. | 1971
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Esta resenha é decorrente do seminário realizado na disciplina « CTS – questões contemporâneas»
do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Está aqui publicada
para poder servir como mais uma ferramenta motivadora para a leitura da obra. A disciplina está
sob a responsabilidade do professor Walter Antonio Bazzo; esta resenha também teve o seu
aval.
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Sobre o livro aqui resenhado, primeiramente, é importante colocarmos algumas palavras sobre a
autoria. Neil Postman (1931-2003) foi um teórico e professor do departamento de comunicação da
Universidade de Nova York, sendo um grande nome da crítica social estadunidense do século XX.
Sua extensa obra possui como centro de investigação as relações entre sociedade, educação e
tecnologias de comunicação, as quais foram abordadas em outros livros que escreveu, como:
Amusing ouselves to death (1985), Tecnopólio: a rendição da cultura à tecnologia (1992) e O
desaparecimento da infância. (1994)
Em Contestação: Nova fórmula de ensino, Postman e Charles Weingartner (que foi colaborador em
diversas outras publicações), apresenta uma severa crítica ao sistema de ensino estadunidense
e propõe outro modelo de ensino para que se subverta o ensino convencional praticado em escolas
e universidades na década de 1960. Infelizmente, de lá para cá pouca coisa mudou, mesmo tendo
passados 50 anos do lançamento do livro, o que faz a obra ser, de certa maneira, atemporal,
tornando os questionamentos e reflexões propostos muito pertinentes para pensarmos o tempo
presente.
A subversiva prática de ensino proposta pelos autores já é anunciada no título original da
obra: Teaching as a subversive activity. Contudo, para a edição brasileira, o título foi
mudado. Pensamos que isso ocorreu pelo contexto político em que a obra foi traduzida. Vigorava
em nosso país, na época, a ditadura militar, dessa forma, a crítica de Postman e Weingartner ao
modelo tecnicista, que aqui era adotado, podia ser somada a outras que já eram feitas ao
sistema ditatorial como um todo, o que não seria bem aceito por parte dos dominantes.
Especificamente sobre os capítulos do livro, pensamos que esse pode ser dividido em dois
grandes blocos (o livro original apresenta um total de 13 capítulos, que não são organizados
em blocos). Em um primeiro bloco, os autores explicitam a ideia de formar estudantes capazes
de «detectar o lixo» e, após, eles discorrem sobre questões curriculares e relacionadas à
linguagem. Na segunda parte do texto, eles defendem a sua proposta para um novo modelo de
ensino, tanto para os estudantes da educação básica quanto pensando a formação de professores.
Vale destacar que por mais que os autores façam críticas, muitas vezes ácidas e pesadas, à
escola e ao ensino, eles as fazem com o intuito de vislumbrar que muitos dos problemas
identificados podem ser minimizados/eliminados diante de novas abordagens de educação, tendo
em vista que a educação, na concepção deles, permite o aperfeiçoamento da condição humana,
sendo «a única instituição em nossa sociedade que é imposta a todos e o que acontece na escola
tem uma grande influência – para bem ou para mal». (POSTMAN, WEINGARTNER, 1971, p.15)
Sobre o sistema educacional vigente, os autores trazem uma metáfora interessante e muito
expressiva de suas ideias, a qual é apresentada abaixo:
Um modo de representar a situação atual do nosso sistema educacional é o seguinte:
É como se conduzíssemos um carro-esporte de muitos milhões de dólares, gritando: «Mais
depressa! Mais depressa!», sem deixarmos de tirar os olhos do retrovisor. É um modo bastante
impróprio de dizer onde estamos, muito menos para onde estamos indo e, só por muita sorte, não
nos espatifamos – até agora. Dedicamos uma atenção quase exclusiva ao carro, equipando-o com
toda a espécie de acessórios sofisticados, preparando o motor para alcançar velocidades cada
vez maiores, que parece termos esquecido aonde queríamos ir nele. Obviamente, somos candidatos
a levar um safanão dos diabos. A questão não é se, mas quando. (POSTMAN, WEINGARTNER, 1971,
p. 15-16)
Tal metáfora expressa a ideia de que o sistema educacional não mudou à medida que o mundo ao
nosso redor foi se transformando, o que fez com que as crianças sejam, nas escolas, protegidas
da realidade, sendo educadas para o obsoleto e a partir do medo, evitando com que
aprendizagens significativas e suas inteligências sejam desenvolvidas, pois castiga-se a
imaginação criadora e a independência de espírito. Para Postman e Weingartner, não está se
fazendo o que precisa ser feito. Como proposição, ao reconhecerem que o sistema educacional é
incapaz de gerar energia própria para promover a sua revitalização, eles apontam para a
necessidade de levarmos em consideração ideias de autores de outras áreas do saber para que se
dê uma «terapia de choque na escola» (POSTMAN, WEINGARTNER, 1971, p. 17). No fim da introdução
do livro, os autores indicam algumas leituras, a saber: Understanding media, de McLuhan, The
human use of human beings, de Wiener, On becoming a person, de Rogers, Science and sanity, de
Korzybsld e Practical criticism, de Richards, entre outros.
No primeiro capítulo, chamado de «a detecção do lixo», os autores questionam se vivemos, de
fato, em uma sociedade democrática. Tal pergunta pode nos assustar em um primeiro momento,
contudo os autores nos ajudam a desvelar essa questão ao justificarem que as pessoas poderosas,
com interesses políticos e financeiros, «preferem muito mais que as escolas pouco ou nada
façam para encorajar os jovens a inquirir, duvidar ou contestar qualquer setor da sociedade em
que vivem, especialmente aqueles setores que são os mais vulneráveis» (POSTMAN, WEINGARTNER,
1971, p. 20). Nesse sentido, as seguintes perguntas são fundamentais: A quem pertencem as
nossas escolas? E a que interesses elas estão preparadas para servir? A seguir, os autores
fazem o relato de uma situação que envolveu o célebre escritor Hemingway, que já irritado com
as perguntas feitas por um jornalista afirmou que «para ser um grande escritor, uma pessoa
deve ter dentro de si um detector de lixo à prova de choque». Nesse sentido, Postman e
Weingartner afirmam que é necessário que percebamos que o conhecimento que construímos
enquanto humanidade «é um amálgama de concepções errôneas, suposições defeituosas,
superstições e até mentiras» (POSTMAN, WEINGARTNER, 1971, p. 21), assim, a nova educação deve
«cultivar pessoas especialistas em detecção de lixo», dentro de uma perspectiva subversiva e
antropológica para a educação, de forma que a pessoa, ao produzir a sua cultura se situe, ao
mesmo tempo, fora dela, para que perceba as abstrações arbitrárias que são colocadas dentro de
nossas sociedades, o que poderia gerar uma formação tolerante e menos preconceituosa das
pessoas.
No capítulo dois, «o meio é a mensagem» defende-se essa ideia partindo do pressuposto que as
mensagens são:
(...) as percepções que nos é consentido construir, as atitudes que somos estimulados a assumir,
as sensibilidades que somos encorajados a desenvolver (quase todas as coisas que aprendemos a
ver, sentir e avaliar). Aprendemos, porque o nosso meio está organizado de tal modo que permite,
ou encoraja, ou insiste em que as aprendamos. (POSTMAN, WEINGARTNER, 1971, p. 38)
De acordo com isso, defende-se que a mensagem que é transmitida nas escolas, mas que também é
transmitida pelos meios de comunicação, por exemplo, pode ser identificada a partir do que as
pessoas são chamadas a fazer. Ao percebemos que os professores fazem perguntas convergentes,
em que os aprendizes adivinham o que o professor está pensado/quer que ele diga (independente
da disciplina), o processo educacional se torna muito reduzido. Eles apontam, nesse capítulo,
inclusive, 8 intenções não explicitadas pelos professores, mas que regem a prática da maioria,
em que, a partir da estrutura da aula ministrada, através do papel do professor/do aprendiz,
das regras do jogo verbal, dos direitos que são postos, das disposições tomadas para a
comunicação e dos atos que são elogiados ou censurados configuram uma mensagem que é comunicada
silenciosamente, insidiosamente, implacavelmente e com grande eficácia. No momento em que
tivermos aprendido a fazer perguntas, que sejam substanciais, relevantes e apropriadas, nós
teremos expandido os nossos limites fazendo com que ninguém nos impeça de aprender o que
quisermos ou o que precisarmos de saber.
No terceiro capítulo, os autores apresentam o método de inquérito como possibilidade para
reformar a estrutura da escola. Eles defendem que a ideia de um currículo contínuo ou em
espiral não é adequada, pois os aprendizes não se comportam ou aprendem a partir de sequências
e compartimentos. Para Postman e Weingartner «se quisermos visualizar o processo de
aprendizagem, talvez seja mais autenticamente representado numa tela de Jackson Pollack, cujas
cores aumentam de intensidade à medida que o poder intelectual cresce, pois, a aprendizagem é
exponencialmente cumulativa» (POSTMAN, WEINGARTNER, 1971, p. 55). Em seguida, os autores
apresentam algumas características que consideram relevantes para os bons aprendizes, assim
como as dos professores, pois «não pode haver qualquer inovação significativa na educação que
não tenha em seu centro as atitudes dos professores e é ilusório pensar de outro modo».
(POSTMAN, WEINGARTNER, 1971, p. 58)
No quarto capítulo, intitulado «em busca da relevância», coloca-se que os professores devem
cultivar um comportamento nos aprendizes de forma que seja fomentada a formulação de perguntas,
a definição e a observação, a classificação e a generalização, a verificação e todas as outras
aptidões e recursos do inquérito, tendo em vista o que foi apresentado no segundo capítulo do
livro, em que se defendeu que o meio é a mensagem.
No capítulo cinco, chamado de «que vale a pena fazer?», Postman e Weingartner propõem e
exemplificam o que chamam de «currículo-questionário», formado por perguntas divergentes,
capazes de gerar outras perguntas que potencialmente podem expandir a aprendizagem dos
aprendizes. Em seguida, eles apresentam a transcrição de uma aula baseada em inquérito para
demonstrar que é possível que matéria ensinada em aula seja dada pelas próprias respostas dos
aprendizes aos seus questionamentos.
No sexto capítulo, denominado «formação de significações», os autores afirmam que os processos
de mentalização que passamos quando aprendemos são simultâneos, pois as pessoas pensam, se
emocionam e se espiritualizam ao mesmo tempo. Existem cada vez mais provas de que nós fazemos a
realidade à medida que a percebemos, ao invés de «recebê-la» ou «refleti-la» passivamente, por
isso, não se coloca apenas uma disputa sobre os nomes que deveremos usar para «coisas», mas,
fundamentalmente, está em jogo sobre que «coisas» devem ter nomes. Portanto, a estrutura da
nossa linguagem não é neutra e por mais que a nossa estrutura fraseológica favoreça a ideia de
que cada um de nós está separado e é distinto do que se situa fora das nossas peles essa visão
é incorreta. Para fundamentar tais ideias, os autores usam os constructos do cientista Adelbert
Ames Jr., colocando, ao final, que conhecimento é aquilo que sabemos depois que aprendemos.
No capítulo sete, chamado «a função da linguagem», os autores retomam a ideia de que a
linguagem não é neutra e que não obtemos significações a partir de coisas, nós atribuímos
significações às coisas, por isso, cada linguagem representa um modo único de perceber a
realidade, o que, de certa forma, nos encarcera em uma espécie de «casa de linguagem». Frente a
isso, uma nova educação, na concepção dos autores, além de ser centrada no estudante e na
pergunta, deve ser também centrada na linguagem para que os aprendizes se tornem sistemas
abertos, pois a escola, infelizmente, «cria sistemas fechados com suas decisões predeterminadas,
limitando os seus recursos de linguagem». (POSTMAN, WEINGARTNER, 1971, p. 161)
No oitavo capítulo, intitulado «novos professores», os autores identificam 16 propostas-base
para a nova educação e no capítulo nove, chamado «escolas públicas», eles afirmam que a
comunidade deve se tornar currículo a ser aprendido, Postman e Weingartner, inclusive,
identificam alguns tipos de programas que podem ser oferecidos pelas escolas.
No capítulo dez, «novas linguagens: os meios de comunicação», os autores fazem um histórico da
invenção da escrita até os dias de hoje defendendo que temos que aprender sobre os meios de
comunicação, a fim de que não fiquemos à mercê daqueles que os controlam.
No capítulo onze, «duas alternativas» trazem-se dois casos de ensino, um de Frank Miceli
chamado de «educação e realidade» e outro de Elliott Carlson denominado «jogos na aula», para
exemplificar que a nova educação pode ser realizada de múltiplas maneiras, dentre elas, a
partir de um currículo de perguntas, um currículo de sistemas ou até um currículo de jogos.
No capítulo doze, «o que fazer?», identificam-se algumas ações que o professor pode fazer para
construir uma nova educação e no último capítulo, denominado «estratégias de sobrevivência»,
Postman e Weingartner afirmam que a nossa tarefa enquanto professores é a de nos desfazer de
conceitos irrelevantes para a aprendizagem. Nesse sentido, eles elencam cânones arcaicos da
escola. Novas estratégias intelectuais para a sobrevivência devem surgir de conceitos como
relatividade, probabilidade, contingência, incerteza-função, estrutura como processo,
causalidade (ou não causalidade) múltipla, relações não métricas, graus de diferença e
incongruência (ou diferença simultaneamente apropriada), fazendo com que:
A nova educação tenha como finalidade o desenvolvimento de um novo tipo de pessoa, uma que será
uma personalidade indagadora, flexível, criadora, tolerante, inovadora, liberal, capaz de
enfrentar a incerteza e a ambiguidade sem desorientação, que poderá formular novos e viáveis
significados para fazer frente às mudanças no meio que ameaçam a sobrevivência individual e
mútua. A nova ·educação consiste em fazer os estudantes usarem os conceitos mais apropriados ao
mundo em que todos nós temos que viver (...) A finalidade é ajudar todos os estudantes a
desenvolverem «detectores de lixo» à prova de choque, como equipamento básico em seu
ferramental e sobrevivência.
Diante da relevância e da atualidade de suas propostas, o livro «a contestação» é leitura
obrigatória para professores (em formação e/ou em atuação) que estejam comprometidos a repensar
as suas práticas a fim de que essas estejam em fase com a dinâmica das transformações que
acometem a nossa sociedade, principalmente diante dos inúmeros avanços científicos e
tecnológicos que vislumbramos cotidianamente. Além disso, é urgente que comecemos a reconhecer
o protagonismo dos aprendizes no processo de aprendizagem e que façamos questionamentos a
respeito do mundo à nossa volta para que exista, de fato, transformação e não reprodução social.
Clayton Barbosa Ferreira Filho e Larissa Zancan Rodrigues | PPGECT | UFSC
De pernas pro ar: a escola do mundo ao avesso
Eduardo Galeano | Porto Alegre – L&PM | 384 p. | 1999/2009
Resenha | Thiago José Perozzo Cardoso | PPGECT | UFSC
De pernas pro ar: a escola do mundo ao avesso
Eduardo Galeano | Porto Alegre – L&PM | 384 p. | 1999/2009
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Esta resenha é decorrente do seminário realizado na disciplina « CTS – questões contemporâneas»
do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Está aqui publicada
para poder servir como mais uma ferramenta motivadora para a leitura da obra. A disciplina está
sob a responsabilidade do professor Walter Antonio Bazzo; esta resenha também teve o seu
aval.
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De Pernas pro ar (1999) é mais uma dentre as diversas obras do jornalista e escritor uruguaio
Eduardo Huges Galeano, autor também do clássico As Veias Abertas da América Latina (1971), seu
grande sucesso. O livro foi finalizado em meados de 1998 e conta com diversas ilustrações,
feitas pelo artista mexicano José Guadalupe Posada.
No primeiro destes tópicos, A escola do mundo ao avesso, nos é mostrado o quão contraditória é
a nossa sociedade, que dividida em pobres, classe média e ricos, tenta-se igualar todo mundo,
mas é o «mundo, que oferece o banquete a todos e fecha a porta no nariz de tantos, é ao mesmo
tempo igualador e desigual: igualador nas ideias e nos costumes que impõe e desigual nas
oportunidades que proporciona» (p. 35). É pautada pelo consumismo extremo e privilégio de
poucos, em detrimento de muitos, que sofrem com esta relação de poder. É uma sociedade
hipócrita. Em Seminário de ética nos é mostrado que existe uma falsa moral na qual punições
não são as mesmas para ricos e pobres e a tecnologia, tida como salvadora da humanidade, é
justamente um dos problemas, como aumento do desemprego, da fome e da violência.
Isso acaba gerando diversos tipos de medo: medo de não ter, medo de perder o que têm e medo do
outro, o qual é sempre o vilão. Cátedras do medo é um reflexo do nosso modo de vida, com muita
xenofobia e com aversão a opinião do outro, quando contrária à sua. Existe uma dificuldade de
convivência entre pessoas diferentes, parece que não existe muita tolerância. Contudo, toda
essa ideia de pânico gera muito lucro e ajuda a manter os privilégios e a concentração de
renda. O crime compensa para os ricos e poderosos, o capital e o poder estão acima de tudo, o
planeta é descartável e está a serviço deles, não importa o quanto isso custe (guerras,
ditaduras, mortes em massa, destruição da natureza), são Aulas magistrais de impunidade. Os
bens de consumo acabam tendo mais valor do que a própria vida e as máquinas têm mais direitos
do que os próprios seres humanos «Nesta civilização onde as coisas importam cada vez mais e as
pessoas cada vez menos, os fins foram sequestrados pelos meios» (p. 236).
A sociedade de consumo esmaga as pessoas, o individual prevalece sobre o coletivo e a Pedagogia
da Solidão é a cartilha a ser seguida, «Esse modo de vida não é bom para as pessoas, mas é
muito bom para a indústria farmacêutica” (p. 238). Somos o tempo inteiro bombardeados por
propagandas que nos dizem que a felicidade está no status, no consumo, precisamos sempre do
melhor e mais novo, não importa o que seja. As informações são manipuladas, sempre visando
atender melhor aos interesses de alguém, são poderosas demais para serem acessíveis a todos.
Mesmo escrito a quase 20 anos atrás, a obra continua extremamente atual, muito em função do
tema tratado: as relações de poder e suas consequências (racismo, homofobia, machismo, luta de
classes, hipocrisia, violência), presentes em nossa sociedade: «Isso é coisa de mulher, diz-se
também. O racismo e o machismo bebem nas mesmas fontes e cospem palavras parecidas». (p.66).
Através dos seis tópicos de estudos, Galeano relaciona essas relações com saúde, educação,
comunicação, industrialização, economia, política e ecologia.
«Fim do século, fim do milênio: fim do mundo? Quantos ares não envenenados ainda nos restam?
Quantas terras não arrasadas, quantas águas não mortas? Quantas almas não enfermas? Em sua
versão hebraica, a palavra enfermo significa «sem projeto» e esta é a mais grave enfermidade
entre as muitas pestes deste tempo. Mas alguém, sabe-se lá quem, andou escrevendo num muro da
cidade de Bogotá: Deixemos o pessimismo para tempos melhores.» (p. 298)
É uma obra impactante, com pitadas de ironia e um tom de poesia, construída através de uma
série de «tópicos de estudos», baseados em uma bibliografia variada, que muito lembra artigos
acadêmicos, tornando a leitura simples e mais objetiva, sem que haja necessidade de seguir uma
ordem específica. Nesse sentido, Eduardo Galeano nos mostra o porquê de ser considerado um dos
grandes escritores, não só da América Latina, mas de todo o mundo. Leitura fundamental para
qualquer educador.
Thiago José Perozzo Cardoso | PPGECT | UFSC
Utopia para realistas: como construir um mundo melhor
Rutger Bregman | Sextante| RJ | 256 p.| 2018
Resenha | Maércio Djoni Sumann e Raquel Soares dos Santos| PPGECT | UFSC
Utopia para realistas: como construir um mundo melhor
Rutger Bregman | Sextante| RJ | 256 p.| 2018
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Esta resenha é decorrente do seminário realizado na disciplina « CTS – questões contemporâneas»
do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Está aqui publicada
para poder servir como mais uma ferramenta motivadora para a leitura da obra. A disciplina está
sob a responsabilidade do professor Walter Antonio Bazzo; esta resenha também teve o seu
aval.
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Em uma época de grandes avanços em várias áreas da sociedade, sem pararmos para refletir ou
encontrar respostas quando nos questionamos sobre onde estamos indo e onde queremos chegar com
isso tudo, é que surge o jovem historiador holandês Rutger Bregman com uma ideia de “Utopia
para Realistas”, na qual nos faz pensar sobre maneiras de “construir um mundo melhor”.
Nossa civilização já passou por muitas mudanças que se tornaram marcos históricos e de grande
importância para a atual situação que nos encontramos. E muitos desses fatos foram, em algum
momento da história, uma grande utopia. Mas tornaram-se realidade e que, então, nos remetem a
quanto é necessário termos uma utopia como ponto de partida rumo à realização da mesma.
Ao iniciar o livro com uma coletânea de fatos e dados reais de programas sociais que deram certo
em diferentes lugares, contextos e culturas, o autor do livro nos convida a entender o quanto
uma tentativa do governo de melhorar a vida de seus cidadãos pode (e deve) ser uma ótima ideia.
Girando em torno de três pontos centrais – renda básica universal, semana de trabalho de 15
horas e mundo sem fronteiras – sempre trazendo fundamento para suas proposições, o autor mostra
o quanto é possível a realização desses fatos, pensando no bem-estar e em uma vida saudável a
todos de maneira digna. Sem fazer críticas diretas às maneiras de governo, ficam subjetivos
muitos questionamentos e contrapontos a regimes adotados que não levam em consideração todos os
sujeitos de cada população.
Ao trazer pontos de vista e estudos do âmbito econômico, político e humanitário, Bregman se
preocupa em se fazer entender, de maneira bem fundamentada, ao desejar que tenhamos mais
utopias na época em que vivemos. Segundo o mesmo, avançamos tanto em considerável curto espaço
de tempo que sentimos internamente que já não temos muito para avançar, porém ainda há muitos
problemas para resolver!
Ao descrever sobre ao que leva o título da obra, o autor se dedica, também, em deixar
esclarecidas as diferenças entre a utopia e a distopia. É como se fossem opostas, logo, quanto
menos se tem de uma, mais se consegue da outra. E viver a distopia é viver de maneira caótica.
“Um mapa do mundo que não inclua Utopia não vale a pena, pois deixa de fora o único país em que
a Humanidade está sempre pousando. E quando a Humanidade chega lá, parece, e, vendo um país
melhor, zarpa. O progresso é a realização de utopias.” – Oscar Wilde. É com essa ideia que
Bregman aborda durante seu livro a ideia de Utopia. Uma ideia de um lugar que nunca
alcançaremos, e se, por acaso, alcançarmos, já não será mais uma utopia, pois deixa de ser algo
inalcançável e acaba por perder o objetivo de estar sempre em busca desse lugar. O livro de
Bergman é um convite a percebermos o quanto ainda temos a evoluir tendo em vista lugares e
situações utópicas, sem fugir da realidade.
Ao final da leitura de Utopia para Realistas duas palavras ecoam na cabeça quando se pensa em
um mundo melhor: justiça e dignidade. Ser justo com todos de acordo com o que têm ou o que lhes
falta. E assim, por consequência, propiciar a cada ser humano um mínimo de dignidade que
deveria ser o básico a cada pessoa.
Maércio Djoni Sumann e Raquel Soares dos Santos| PPGECT | UFSC
Dez argumentos para deletar agora suas redes sociais
Jaron Lanier | Intrínseca | RJ | 145 p.| 2018
Resenha | Willian Grecillo dos Santos e Adamo Devi Cuchedza| PPGECT | UFSC
Dez argumentos para deletar agora suas redes sociais
Jaron Lanier | Intrínseca | RJ | 145 p.| 2018
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Esta resenha é decorrente do seminário realizado na disciplina « CTS – questões contemporâneas»
do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Está aqui publicada
para poder servir como mais uma ferramenta motivadora para a leitura da obra. A disciplina está
sob a responsabilidade do professor Walter Antonio Bazzo; esta resenha também teve o seu
aval.
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Em «Dez argumentos para deletar agora suas redes sociais» o autor Jaron Lanier expõe um cenário
preocupante em relação aos impactos das redes sociais nas relações humanas. Segundo o autor,
que é especialista em tecnologia no Vale do Silício, muitos desses impactos são antecipados por
características trabalhadas pelos desenvolvedores dos algoritmos que regem essas redes sociais,
ou seja, são intencionais.
Jaron Lanier fez sua carreira no Vale do Silício desenvolvendo os principais aparatos
comerciais para realidade virtual, como os óculos, luvas e softwares. Além de suas empresas na
área da tecnologia, auxiliou no desenvolvimento de diversas startups no Vale do Silício e
participou do desenvolvimento do algoritmo de reconhecimento facial que o Facebook utiliza hoje
em sua plataforma. O autor relata, tanto em sua obra como em palestras, que ao participar de
testes de projetos iniciais alinhados a proposta de construir plataformas de relacionamento via
internet percebeu alguns aspectos curiosos em relação ao seu comportamento e dos demais
usuários dentro das redes. A partir dessas observações e sentimentos, começou a escrever sobre
os impactos das tecnologias digitais no ser humano em obras anteriores como Bem-vindo ao
futuro, gadget ‒ você não é um aplicativo e Dawn of the new everything.
Considerando redes como o Facebook, que já superou a marca de 2 bilhões de usuários no mundo,
mais de 130 milhões só no Brasil, as discussões desenvolvidas pelo autor no livro se tornam de
grande relevância para se compreender aspectos da relação do ser humano com as mídias digitais,
bem como de que maneira essas tecnologias influenciam na sociedade como um coletivo, e não
somente os sujeitos de forma individual.
Logo no primeiro argumento, o autor identifica elementos dos algoritmos que compõem as redes
sociais desenvolvidos especificamente para engajar os usuários, ou seja, viciá-los. Como
especialista em tecnologia digital e programador de software, ele descreve toda a estrutura de
funcionamento desses algoritmos e qual metodologia eles utilizam para viciar seus usuários: a
do behaviorismo. Ainda, são citados trechos retirados de entrevistas concedidas por dois
sujeitos durante a portais de notícias dos Estados Unidos. O primeiro é Sean Parker, o qual foi
desenvolvedor e primeiro diretor do Facebook, e o segundo é Chamath Palihapitiya, que também
participou do desenvolvimento do algoritmo da plataforma e foi o primeiro diretor de
crescimento de usuários do Facebook, nas quais eles admitem ter construído o Facebook com uma
estrutura desenhada para viciar seus usuários baseada no behaviorismo. Nesse sentido, fica
clara a intenção dos criadores dessas plataformas, com o Facebook sendo a primeira e as demais
seguindo seus passos, a qual não vai ao encontro de slogans estampados nesses sites, como
aproximar as pessoas ou facilitar a vida dos usuários, mas sim de viciá-los e ocupar a maior
parte possível de seu tempo, mas com que propósito?
Viciar seus usuários e tomar-lhes a maior parte de seu tempo é apenas o primeiro passo, mas o
que esses magnatas do mundo digital ganham com isso? Dados. Essas plataformas coletam
quantidades inimagináveis de dados sobre seus usuários a todo momento e dos mais variados
tipos, como suas preferências ou o que não agrada muito, conexões, tempo de uso, reação a
propagandas e notícias, localização de gps, quanto tempo do vídeo foi assistido, se abre as
matérias e quais abre, entre outros vários. Essas informações são muito valiosas para os
proprietários dessas plataformas e é nessa ideia que o autor constrói os demais argumentos,
discutindo como esses dados são utilizados para manipular o comportamento dos usuários e até
mesmo alguns efeitos não antecipados pelos criadores desses algoritmos. Para obter lucro, esses
dados são vendidos para corporações que desejam manipular algum grupo específico da sociedade,
seja com fins comerciais, para fazê-las consumir algum produto, ou políticos, e para esses é
fácil pensar em alguns exemplos.
Porém, alguns efeitos inesperados pelos seus desenvolvedores começaram a surgir a partir do uso
excessivo dessas plataformas por seus usuários, como por exemplo um individualismo incomum
alimentando um egoísmo e uma incapacidade de dialogar com ideias diferentes. Ainda, estudos
indicando aumento do risco de desenvolvimento de depressão, ansiedade e isolamento a partir do
uso excessivo de redes sociais estão se tornando cada vez mais recorrentes na produção
científica mundial. Nesse sentido, o autor começa a desenvolver a maioria de seus argumentos,
discutindo esses efeitos tóxicos das redes sociais no psicológico humano de maneira a
demonstrar ao leitor o quanto essas plataformas estão sendo nocivas para sua saúde mental. Ele
ainda demonstra, junto com os próprios desenvolvedores dessas tecnologias, uma preocupação
especial com as novas gerações que estão nascendo e se desenvolvendo dentro desse mundo baseado
em relações virtuais e algoritmos construídos para manipulá-los.
Hoje não é difícil flagrar um motorista com uma mão na direção e outra rolando pela tela de um
smartphone dentro de um carro em movimento ‒ ou até nós mesmos… ‒, ou quase se chocar com
alguém na calçada porque o celular precisava de atenção naquele momento. O vício em
smartphones, dentro dos quais a maior parte do tempo é gasto em redes sociais, é uma realidade
da nossa sociedade e qualquer pessoa que em algum momento se perguntou se havia algo de errado
na maneira como o ser humano tem se entregado a esses aparelhos, deveria ler essa obra. Essa é
uma preocupação genuína pois, «[...] na minha opinião, isso está erodindo o alicerce de como
as pessoas se comportam umas com as outras», como escreve o autor ao citar uma fala de Chamath
Palihapitiya. E para pais e educadores, que hoje assistem seus filhos e alunos mergulhando
profundamente nessas tecnologias, trocando o contato humano, amizade e afeto por uma montanha
de likes em uma foto no Facebook «Só Deus sabe o que as redes sociais estão fazendo com o
cérebro de nossos filhos», escreve o autor citando Sean Parker.
A leitura é leve e, apesar de tratar de temas complexos como algoritmos de programação e
economia, o autor desenvolve suas discussões com muita clareza e propriedade utilizando bons
exemplos e analogias com elementos do cotidiano. Ainda, essas discussões são desenvolvidas a
partir de uma análise da realidade, baseando-se em elementos das relações humanas e não apenas
aspectos estatísticos dos algoritmos.
Willian Grecillo dos Santos e Adamo Devi Cuchedza| PPGECT | UFSC
iGEN - Por que as crianças superconectadas de hoje...
Jean M. Twenge | Editora NVersos | SP | 368 p. | 2018
Resenha | Liciana Gai Garcia e Tiago Morais Nunes | PPGECT | UFSC
iGEN - Por que as crianças superconectadas de hoje...
Jean M. Twenge | Editora NVersos | SP | 368 p. | 2018
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Esta resenha é decorrente do seminário realizado na disciplina « CTS – questões contemporâneas»
do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Está aqui publicada
para poder servir como mais uma ferramenta motivadora para a leitura da obra. A disciplina está
sob a responsabilidade do professor Walter Antonio Bazzo; esta resenha também teve o seu
aval.
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Um excelente estudo realizado por Jean M. Twenge, professora de psicologia na Universidade
Estadual de San Diego, com o objetivo de nos fazer conhecer, orientar e entender a geração i,
também denominada geração Z ou centennials, que nos Estados Unidos representa os jovens
nascidos a partir de 1995, no Brasil, de 2000 a 2009. Nessa pesquisa a autora sustenta que a
predominância absoluta dos smartphones entre os adolescentes tem efeitos que vão desde as
interações sociais à saúde mental e que essa é a primeira geração com acesso constante a
internet.
Mas além da tecnologia, o que diferencia a geração i das anteriores? Segundo Twenge, «i»
representa também o individualismo marcante de seus membros, uma ampla tendência que norteia
seu senso inabalável de igualdade, assim como sua aversão às regras atuais. A partir de quatro
grandes levantamentos foram identificadas dez tendências que moldam a geração i: sem pressa;
internet; não mais ao vivo; insegura; isolada, mas não intrínseca; insegurança financeira;
indefinida; inclusiva; independente, as quais intitulam os capítulos do livro.
Todas essas tendências são descritas em comparação às gerações anteriores na época em que
tinham as mesmas idades. A partir de 2012, mudanças inesperadas nos comportamentos e estados
emocionais dos adolescentes começaram a ser percebidas, coincidentemente, ou não, culminando
com o aumento do uso dos smartphones. Twenge relata que a geração i está sem pressa, crescendo
lentamente e, em comparação aos seus antecessores, são menos propensos a dirigir, namorar,
fazer sexo, trabalhar e a ingerir álcool. Não se rebelam com a superproteção dos pais, aprovam,
pois cresceram sendo monitorados pelas telinhas dos smartphones o que os faz sentirem seguros
devido a esse controle. Outro fator diferencial dessa geração é o tempo que passam on-line.
Esses jovens parecem ter aversão à mídia impressa. Passam muitas horas postando em redes
sociais e digitando mensagens de texto o que não tem se mostrado proveitoso para a compreensão
de textos ou redações acadêmicas. Segundo pesquisadores, mudam de tarefas a cada 19 segundos e
a maioria das janelas ficam abertas por menos de 1 minuto, o que é bem diferente de sentar e
ler um livro durante horas.
Durante a leitura Twenge nos faz perceber que os centennials não têm interesse em se comunicar
ao vivo. As relações humanas perderam espaço para as relações virtuais o que tem colocado em
risco a saúde mental da geração i. O mundo das redes sociais é perfeito. Todos postam somente
suas vidas maravilhosas e tudo sempre dá certo. Como o contato físico foi substituído pelas
telinhas, os adolescentes perderam também a convivência real, na qual juntos passavam por todos
os tipos de experiências, fracassos e vitórias. Agora, quando percebem que suas vidas não são
perfeitas como a postada pelos amigos, surge a inveja, juntamente a depressão. Sentem-se
excluídos e sozinhos quando não são convidados a participarem de algum evento que julgam
importante. Subtraem várias horas de sono hipnotizados pelas telas dos smartphones, fato que,
comprovadamente, aumenta o risco de depressão e suicídio.
A geração i está descrente e não frequenta nenhuma religião, principalmente, devido a
desconfiança dos jovens em relação às instituições. O dinheiro está em alta e o sentido está
em baixa. Cada vez mais propensos a dizer que é mais importante se dar bem financeiramente do
que desenvolver uma filosofia de vida significativa. Frequentam as universidades apenas para
conseguirem um emprego melhor assim que se formarem, aprender para valer não é o principal
objetivo. Prezam por ambientes seguros e equiparam o discurso a violência física. Mostram-se
muito preocupados com os outros e com a comunidade, no entanto não sabem o que fazer para
ajudar. São muito criativos para fazer campanhas e mobilizações em redes sociais, mas não são
propensos a entrar em ação fora delas. São inconformistas, materialistas, interessados em usar
o dinheiro para se destacar, não para ser como os outros.
Menos propensos a fazer sexo na adolescência e no início da vida adulta em decorrência de
passarem menos tempo ao vivo com seus pares. A iGen poderá ser a geração com o maior número de
solteiros e com a menor taxa de natalidade já registrada nos Estados Unidos. O acesso à
internet pode ser uma das razões do declínio da gravidez nas últimas décadas, devido à
facilidade que os adolescentes têm de buscar informações on-line sobre controle de natalidade
ou de se comunicarem eletronicamente. Em geral, afirma Twenge, os centennials estão cada vez
mais desligados de relacionamentos humanos, exceto com seus pais.
A geração i é inclusiva, espera igualdade em relação às identidades LGBT, de gênero e de etnia.
Citam frequentemente razões individualistas para a sua escolha partidária, têm o foco em
segurança e preocupação acentuada com as perspectivas econômicas sendo mais conservadores
politicamente. Põem o indivíduo em primeiro lugar. São a favor da maconha legal, aborto legal,
conforme o princípio de que o governo não deve restringir os direitos individuais.
A obra iGen é um excelente trabalho de pesquisa realizado por Jean M. Twenge, com estudantes da
geração i, nas escolas e universidades dos Estados Unidos e deve ser analisado por todos, pais
e educadores de qualquer nacionalidade, pois as telas dos smartphones «dominaram» a vida, não
só dos adolescentes, mas da maioria das pessoas e, cada vez mais, têm causado o estreitamento
das relações humanas. Como interferir e mudar essa realidade que tem se mostrado tão
assustadora, levando muitos de nossos jovens a infelicidade, a depressão e ao medo? Podemos
tentar, basta seguirmos um dos conselhos de Twenge: «largar o celular e fazer outra coisa.»
Esse livro nos esclarece e desafia. É um convite à leitura!!!
Liciana Gai Garcia e Tiago Morais Nunes | PPGECT | UFSC
A civilização do Espetáculo: uma radiografia do nosso tempo e da nossa cultura
Mario Vargas Llosa | Objetiva| RJ | 207 p. | 2013
Resenha | Maíra Caroline Defendi e Jeraldi Hiroki | PPGECT | UFSC
A civilização do espetáculo: uma radiografia do nosso tempo e da nossa cultura
Mario Vargas Llosa | Objetiva| RJ | 207 p. | 2013
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Esta resenha é decorrente do seminário realizado na disciplina «CTS – questões contemporâneas»
do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Está aqui publicada
para poder servir como mais uma ferramenta motivadora para a leitura da obra. A disciplina está
sob a responsabilidade do professor Walter Antonio Bazzo; esta resenha também teve o seu
aval.
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Vargas Llosa é um escritor peruano, jornalista, ensaísta, dramaturgo e crítico literário,
vencedor de prestigiosos prêmios, entre eles, o Nobel de Literatura de 2010. Na juventude foi
simpatizante do socialismo, no entanto, ao longo de sua carreira, acabou por adotar posições
liberais, principalmente ao que se refere a questões econômicas e um posicionamento mais
conservador em relação a aspectos políticos, culturais e da vida social, o que pode ser
percebido com frequência ao longo de sua obra e de suas polêmicas declarações públicas.
A Civilização do Espetáculo: Uma radiografia do nosso tempo e da nossa cultura de Mario Vargas
Llosa, é um livro do gênero artigo de opinião que reúne textos críticos e ensaios sobre a
cultura e como esse conceito tem se transformado na sociedade nas últimas décadas.
O livro A civilização do Espetáculo é uma importante leitura, principalmente na conjuntura
política e econômica atual, pois trata de muitos aspectos de fundamental discussão, que
perpassam a política, a economia e a sociedade, a partir de um argumento central, a cultura.
A envolvente e engenhosa capacidade narrativa do escritor torna a leitura dessa obra uma
experiência bastante agradável. As definições sobre cultura, defendidas por Llosa, podem, num
primeiro momento, causar uma impressão ingênua de que a cultura atual está quase totalmente
deteriorada, carecendo de valores hierárquicos para balizar seu status de «alta cultura» ou
«cultura de elite». Como já mencionado anteriormente, os apontamentos e análises de Llosa,
muito bem escritos e minuciosamente articulados, têm de fato o seu valor, principalmente no que
se refere à falta de senso crítico, sensacionalismo e o conspiracionismo falacioso em que a
cultura contemporânea está imersa.
No entanto, essa característica hierárquica e conservadora da cultura defendida por Llosa é
exatamente uma das nossas maiores críticas em relação ao livro. O fato do autor privilegiar a
superioridade de uma «cultura erudita» e não explicitar a diferença entre cultura popular e de
cultura de massas, acaba favorecendo a impressão de que outras manifestações culturais são
inferiores ou que ocupam lugar de menor destaque, ou relevância. Concordamos com o argumento de
que a ao colocar o entretenimento em primeiro lugar, enquanto valor máximo a ser conquistado em
uma sociedade, a banalização da cultura e das relações humanas, com reflexos no jornalismo, na
política, na religião, no sexo foram inevitáveis. Todavia, equiparar isso a grandes
manifestações culturais, construídas ao longo da humanidade, que tornam o mundo um lugar plural
e com tantas riquezas é um reducionismo inconcebível.
Outro ponto que merece maior atenção, é o fato que frequentemente a argumentação de Llosa é
direcionada a um ponto de vista de caráter reducionista, que acaba por encobrir ou
desconsiderar o impacto do liberalismo econômico na cultura contemporânea, não se comprometendo
com uma análise mais aprofundada sobre as origens e causas dos problemas que levaram nossa
sociedade a ter as características de hoje. Por exemplo, ao falar sobre a confusão entre preço
e valor, ou sobre a corrupção na política, o autor culpa a cultura, ou melhor, o que esta se
tornou, como responsável por esses males, enquanto que ao nosso ver muitas dessas «confusões»
têm raiz no próprio modelo capitalista, que passa quase imperceptível durante a leitura do
livro.
Consideramos importante a leitura e discussão crítica do livro, mesmo discordando de algumas
posturas apresentadas, principalmente, porque devido à habilidade argumentativa do autor, a
leitura do livro torna-se um verdadeiro embate de ideias, concepções, causas e consequências
dos problemas que atravessam a sociedade atual, de forma que é impossível sair da leitura desta
obra sem uma sensação de hesitação e conflito, seja ela por questionar os posicionamentos do
autor, seja por questionar nossos próprios posicionamentos.
Maíra Caroline Defendi e Jeraldi Hiroki | PPGECT | UFSC
21 Lições para o século 21
Yuval Noah Harari | Companhia das Letras | SP | 441 p.| 2018
Resenha | Cristine Saibert e Oliveiros Dias Jr. | PPGECT | UFSC
21 Lições para o século 21
Yuval Noah Harari | Companhia das Letras | SP | 441 p.| 2018
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Esta resenha é decorrente do seminário realizado na disciplina «CTS – questões contemporâneas»
do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Esta aqui publicada
para poder servir como mais uma ferramenta motivadora para a leitura da obra. A disciplina está
sob a responsabilidade do professor Walter Antonio Bazzo e esta resenha também teve o seu
aval.
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O livro «21 lições para o século 21», de Yuval Noah Harari (2018), nos traz reflexões
importantes sobre questões como uso da tecnologia e o desenvolvimento da civilização e da
educação. Dividido em cinco capítulos de escrita leve e envolvente, o autor discute implicações
contemporâneas associadas ao desenvolvimento do processo civilizatório e nos faz refletir sobre
as potencialidades e limitações de pensamentos políticos, religiões e da tecnologia no
enfrentamento dos problemas sociais, políticos e ecológicos que exigem hoje uma mobilização
global.
Harari é historiador e sua leitura do mundo se faz a partir de algumas ideias principais, que
giram em torno da historicidade e da evolução do Homo sapiens, identificando suas forças e
fraquezas frente aos desafios enfrentados pelos humanos num mundo em constante mudança. As
principais ideias do autor que irão nortear suas análises nesta obra são:
● Compreendendo o processo da evolução do Homo sapiens podemos entender melhor a construção
dialética da nossa civilização e os desafios que ela enfrenta hoje e os possíveis
desdobramentos futuros;
● Os seres humanos (Homo sapiens) controlam o mundo porque, diferentemente das outras espécies
na Terra, são capazes de criar narrativas ficcionais e, acreditando nessas narrativas, podem
cooperar melhor do que qualquer outro animal para atingir seus objetivos;
● Os humanos, como espécie, pensam em forma de narrativas e tomam suas principais decisões não
pela racionalidade, mas sim pelo emocional, pelos seus laços emocionais com o seu grupo e,
quanto mais simples a narrativa, melhor;
● Poder criar narrativas ficcionais e acreditar nelas é sua força e também sua fraqueza. Esta
se estabelece na dificuldade em diferenciar realidade de ficção. Esta fraqueza possibilita sua
alienação e possível dominação por forças estruturais da sociedade que ele não consegue
identificar.
A partir desta análise geral, podemos fazer uma breve leitura da obra seguindo a sua
organização, em cinco partes: (1) O desafio tecnológico; (2) O desafio político; (3) Desespero
e esperança; (4) Verdade; (5) Resiliência.
Em O desafio tecnológico, ao apresentar os problemas potenciais do desenvolvimento desenfreado
da tecnologia, em especial da inteligência artificial, Harari nos faz refletir sobre como
estamos desamparados para lidar com essas questões, que nos envolvem cada vez mais. Assim, o
autor discute sobre alguns sistemas políticos que permearam o processo civilizatório até então,
apontando as limitações destes para com o atual desenvolvimento tecnológico que vivenciamos.
Após, reflete especificamente sobre a relação desta imersão na era da tecnologia com o mundo do
trabalho. Neste ponto, ao comentar sobre a possibilidade (cada vez mais presente) de a
inteligência artificial substituir grandes quantidades de profissionais em um futuro próximo, o
autor reflete sobre como lidar com esses aspectos em um mundo de preceitos liberais e permeado
por grandes desigualdades sociais. Vêm à tona a necessidade de se (re)pensar a relação com o
trabalho existente hoje e, também, da conformação da sociedade perante esta nova relação. O
autor, então, segue discutindo as implicações da convergência das tecnologias da informação com
a biotecnologia e, neste ponto, expõe que a utilização e controle de certas tecnologias,
especialmente dos algoritmos de big data, pode levar a apropriação de dados por poucos
indivíduos (empresas ou estado) no futuro, o que comprometeria valores como liberdade e
igualdade, base da ideologia liberal vigente.
Em O desafio político, Harari discute um pouco mais a respeito dos desafios políticos de nosso
tempo. Ao imergir no mundo cada vez mais virtual e tecnológico o homem tem se afastado da sua
corporalidade. Assim, a necessidade de nos conectarmos cada vez mais com nossos corpos e com o
mundo físico atual é discutida pelo autor, em paralelo ao que se discute sobre o papel da
tecnologia na sociedade hoje. Após, o autor discute a necessidade de retomarmos conceitos de
comunidade, de civilização. Fazendo uma retrospectiva dos eventos que levaram à formação da
sociedade que vivemos hoje, é levantada a importância do processo de cooperação entre os
diferentes grupos no sentido de superar problemas cada vez maiores que vieram a surgir no
decorrer de nosso desenvolvimento. Assim, discute-se que problemas globais como aquecimento
global, disrupção tecnológica ou armamento nuclear, necessitam cada vez mais de cooperação dos
diferentes países para que sejam solucionados. Neste ponto, discute-se as implicações do
nacionalismo, da religião e das questões referentes aos imigrantes na construção de uma
consciência global e cooperativa para resolução destes problemas. Vêm à tona a necessidade de
nos aprofundarmos em questões nacionais, religiosas e/ou culturais, se quisermos compreender as
relações contemporâneas atuais que permeiam o mundo e suas diferentes sociedades. Para melhor
analisar as dificuldades e pensar em possíveis soluções, devemos ter em mente que Estado,
nacionalidade e religião são narrativas ficcionais, ter clareza sobre isso faz toda diferença,
uma narrativa que une um grupo também pode isolá-lo de outros, dificultando o entendimento, o
respeito mútuo e respostas aos desafios globais.
Na parte três, intitulada Desespero e esperança, Harari trata do terrorismo, da tendência às
guerras, autodestruição e recomenda nunca subestimar a estupidez humana. O autor reflete sobre
a importância de acessarmos e compreendermos diferentes pontos de vista, de modo que propõe
como remédio para eventuais conflitos «uma boa dose de humildade». Para isso, nos relembra mais
uma vez do processo de evolução da espécie humana, que muito antes de quaisquer leis e
religiões, várias espécies de mamíferos sociais já apresentam uma moralidade desenvolvida, com
regras de comportamento, códigos éticos que restringem o roubo, a traição e o assassinato (por
exemplo) e promovem a cooperação no grupo. O autor então vai apresentar um conceito de
compaixão, de moralidade relacionados à empatia, à diminuição do sofrimento, onde o homem não
pode ser feliz sozinho, sua felicidade e sua dor estão relacionados à felicidade e às dores dos
outros ao seu redor. A partir desta moralidade independente de religião, o autor apresenta os
ideais do secularismo e propõe este como referência para a educação no século 21.
Na parte quatro o autor vai falar da busca pela Verdade. Como podemos buscar a verdade num mundo
onde imperam diversas narrativas diferentes? Neste ponto, o autor chama a atenção para o fato
de que somos seres racionais, porém as emoções estão sempre permeando nossa racionalidade. Da
mesma forma, o autor destaca a ideia de coletividade, explicitando que a característica de se
juntar em grupos em torno de uma narrativa única possibilitou ao Homo sapiens uma vantagem
evolutiva. Dito isto, faz-se uma reflexão a respeito da falta de conhecimento que temos hoje
sobre os processos que regem o mundo e a sociedade que vivemos. Temos uma mente limitada quanto
ao processamento de informação, e estamos inseridos em um mundo cada vez mais especializado e
informado, onde não conseguimos compreender a complexa rede que rege os processos políticos e
econômicos que vivenciamos. Assim, precisamos reconhecer que somos ignorantes sobre estas
questões. E precisamos, a partir desta ignorância, buscar informações para nos auxiliar neste
intrincado projeto de busca pela verdade, uma vez que, ao nos esquivarmos da responsabilidade
de compreender o mundo em que vivemos, podemos estar sendo coniventes com as grandes injustiças
sociais que permeiam nossa sociedade. Assim, o autor alerta que a nossa facilidade de nos
organizarmos em comunidades a partir de narrativas em comum é também o que dificulta a
apropriação de conhecimento crítico por grandes comunidades, pois é natural ao sapiens
acreditar em narrativas de grupo de modo que «[...] na prática, não existe uma divisão clara
entre ‛saber que algo é apenas uma convenção humana’» e ‛crer que algo é inerentemente
valioso’» (Harari, 2018). Neste ponto, Harari traz como orientação na busca pela compreensão do
mundo, o foco no sofrimento. Porque segundo o autor, por mais que uma narrativa seja falsa, o
sofrimento humano que pode vir desta narrativa é real. E é essa busca pelo fim do sofrimento
humano que deveria orientar nossas escolhas. Na prática, devemos estar sempre atentos às
projeções que temos do mundo, formuladas pela nossa mente. Porque nossa mente é constantemente
manipulada pela enxurrada de informações e opiniões que advém do meio externo. Seria, portanto,
o conhecimento maior do nosso eu e das nossas motivações pessoais, o caminho para vivermos de
modo são o mundo atual e suas constantes mudanças.
A parte cinco vai tratar da Resiliência. Se a mudança é a única constante, a educação deve
preparar as pessoas para conviver com ela e assim manter sua sanidade mental. Num mundo onde
as informações estão em grande volume, se faz importante saber filtrar as informações realmente
necessárias para construir um bom conhecimento da realidade. Então, devemos desenvolver as
habilidades necessárias para viver num processo de contínua mudança, daí a resiliência: sofrer
o estresse causado pelas mudanças e conseguir manter sua integridade. Com a participação cada
vez maior das tecnologias em nossas vidas, haverá crises de identidade cada vez maiores. Quem
sou eu? Qual o sentido de estar vivo? Estas serão perguntas cada vez mais presentes. O autor
retoma as análises das velhas narrativas políticas, econômicas e religiosas que a humanidade
criou, concluindo que não servem mais para este «admirável mundo novo». Mas também aponta para
a possibilidade de construção de novas narrativas, que sejam mais flexíveis e resilientes, que
tragam mais sentido para cada um de nós e que respondam aos desafios globais. Se o homem vive
por narrativas, com dificuldades em separar realidade da ficção, o sofrimento por sua vez é bem
real. O autor adentra na questão do sofrimento, partindo da premissa que o sofrimento também
tem origem na ficção e na dificuldade em separá-la da realidade. Então, o sofrimento também tem
origem na mente. Estudar a mente é um processo único e individual. Entender a mente é o
primeiro passo para entender como o homem cria narrativas e como se alia a narrativas de
outrem, sejam elas quais forem, como ele sofre e como pode estar causando sofrimento. O autor
relata o seu processo neste entendimento da sua própria mente através de uma prática de
meditação, de observação da sua mente, chamada Vipassana. Ao mesmo tempo afirma que o processo
é individual, que cada um deve procurar alguma prática, algum processo que o ajude a estudar
sua mente e a si mesmo. Conhecer sua mente possibilita perceber melhor os processos em sua
realidade e a manutenção da sua sanidade frente ao mundo em constante mudança. Melhor nós
mesmos tomarmos a iniciativa de saber quem somos, enquanto ainda há tempo, do que deixar que
tecnologia tome esta decisão por nós. É com esta mensagem que o autor encerra o livro.
Cristine Saibert e Oliveiros Dias Jr. | PPGECT | UFSC
A elite do atraso: da escravidão à Lava Jato
Jessé Souza | Editora Leya | RJ | 243 p. | 2017
Resenha | Letícia Anelise Soares e Seila Mello Santos | PPGECT | NEPET | UFSC
A elite do atraso: da escravidão à Lava Jato
Jessé Souza | Editora Leya | RJ | 243 p. | 2017
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Esta resenha é decorrente do seminário realizado na disciplina «CTS – questões contemporâneas»
do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Esta aqui publicada
para poder servir como mais uma ferramenta motivadora para a leitura da obra. A disciplina
está sob a responsabilidade do professor Walter Antonio Bazzo e esta resenha foi elaborada sob
sua supervisão.
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O livro começa explanando sobre a escravidão no Brasil, que não acabou com a abolição. Ao
contrário, continua até os nossos dias. Entretanto, não escraviza apenas racialmente, mas
também econômica e culturalmente, expropriando a maioria dos indivíduos de seus bens, seus
direitos, suas expectativas, sua esperança. Jessé Souza, neste contexto argumenta que «o
paradigma culturalista é, na verdade, uma falsa ruptura com o racismo científico «racial»
(2017, p.17). Então, essa expropriação vai mais longe, porque desacredita a população geral,
especialmente a brasileira, inclusive de si mesma, de sua capacidade de gerenciar suas vidas,
tomar suas decisões de forma coerente, de sua boa índole. Faz crer serem os brasileiros,
indivíduos desprovidos do padrão moral aceitável, faltando-lhes a virtude da honestidade,
estando estes sempre imbuídos de más intenções, do famoso «jeitinho brasileiro». Essa
ideologia posta, incuti uma visão de descrédito ao brasileiro, de negligência e deslealdade
proposital, visto que considerada intrínseca à sua genética. Logo, inerente a sua cultura.
Como se a corrupção fosse sua marca registrada, incontestavelmente, por se tratar de algo que
lhe é peculiarmente constituinte natural. Nesta concepção, o brasileiro precisa ser monitorado
e governado por indivíduos externos, honrosos de crédito, confiáveis a toda prova.
Relata Jessé Souza, neste livro, ainda, que essa falaciosa ideologia, foi criada pela elite
econômica, a grande usurpadora dos recursos de muitos, em detrimento de alguns poucos que a
constitui, num engodo que mascara quem realmente manda, dominando o capital econômico, social
e cultural da população, a seu bel prazer. O poder político nacional, neste sentido,
constituindo parte da classe média, serviria como bode expiatório, da culpabilização pela
corrupção, quando na verdade é também massa de manobra social, para melhor articulação do
poder econômico na mão de poucos.
Ainda de acordo com o autor, a mídia, desde há muito (e deixando de cumprir seu papel de
denunciar e revelar a verdade), por estar corrompida, como também a inteligência formal
instituída, seja ela judicial, policial e intelectual, também integradoras da classe média,
colaboram na fomentação da imagem corruptível do brasileiro, sempre mal-intencionado e
malsucedido, como também alimentando o ódio e a ação de extermínio da classe inferiorizada.
É ao que se refere SOUZA (2017, p. 14), quando discorre que «o trabalho de distorção
sistemática da realidade realizado pela mídia foi extremamente facilitado pelo trabalho prévio
de intelectuais que forjaram a visão dominante, até hoje, da sociedade brasileira». Assim a
classe dominada, qual seja, a que inclui os pobres, os negros, os menos privilegiados de
cultura, considerados incapazes de se autogerirem, acabam por se tornarem um peso, até mesmo
um incômodo desnecessário à distribuição de renda, portanto, passíveis de serem excluídos,
mortos, segregados, humilhados, tecendo uma malha de preconceito pejorativo à sua existência,
enquanto ser humano que é. No entanto, invisível como tal.
O sociólogo Jessé, escritor desta obra, termina por fazer uma reflexão sobre a operação lava
jato, cuja ação vislumbrou a denúncia, a acusação, o julgamento e a prisão de muitos políticos
da esquerda brasileira, criminalizados como corruptos. Essa ação pensada, planejada,
executada, visou impedir que direitos de alguns poucos fossem crescentemente disponibilizados
a muitos outros, dando-lhes um poder maior (de entendimento, de consumo, de decisão),
inconveniente à elite e sua ditadura totalitária.
Um livro instigante, sem dúvida alguma, no sentido de nos permitir uma ampla e grave reflexão
das intrincadas relações estabelecidas entre a política brasileira, o poder patrimonialista
excludente da minoria e a escravidão social majoritária, no Brasil, como elementos
convergentes na criação do cenário atual da soberania da desigualdade social, ainda a ser
«descoberta» (e não mais encoberta), tanto quanto já o são as riquezas usurpadas de nosso
país.
Letícia Anelise Soares e Seila Mello Santos | PPGECT | NEPET | UFSC
Educação, projeto e valores
Nílson José Machado | Coleção Ensaios transversais | Escrituras Editora | SP | 6a ed. | 2006
Resenha | Luiz Teixeira do Vale Pereira | Nepet | EMC | CTC | UFSC
Educação, projeto e valores
Nílson José Machado | Coleção Ensaios transversais | Escrituras Editora | SP | 6a ed. | 2006
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Navegando pela internet, deparei-me com vídeo-aulas disponibilizadas pela USP. Escolhi uma delas:
Tópicos de Ética e Educação, do professor Nílson José Machado. Estava lá, um curso completo, com
65 vídeos contendo aulas que acompanhei com atenção. Presenteei-me com alguns dias de reflexão.
Discurso sólido, consistente, direto, perpassando temas pertinentes à ação docente. Indissociáveis
dessa ação. Um curso bem estruturado. Palmas para a iniciativa. Mãos à palmatória para a internet.
Já ouvira falar dele. Mas, como engenheiro que sou por formação, seus trabalhos não costumavam esquentar
lugar nas minhas prateleiras, ou se escondiam sob camadas de outras leituras ou – reconheço com alguma
dose de remorso – de poeira mesmo.
Reencontrei um livro dele: Educação, projeto e valores. Limpei. Li como engenheiro, com cabeça de
engenheiro, com olhar de engenheiro. Mas com coração de professor, que sou por função e destino
há quatro décadas. Não pude me desvencilhar de esticar os olhos intrigados e magnetizados para a
leitura do tema projeto que o autor desfia. As vídeo-aulas acenderam o sinal, o livro me deu tempo
para que eu imprimisse o meu ritmo de contato com o conhecimento, caminhando pra frente, pulando pra
trás, relendo, divagando, refletindo, anotando, recomeçando. Tudo no gerúndio mesmo, como eu gosto de
fazer, mas tentando não escorregar pelo gerundismo, tão na moda atualmente.
No capítulo 1, Sobre a ideia de projeto, o professor Nílson desfere uma flechada que visava
primordialmente – imagino – a educação, mas que de quebra acertou em cheio o coração de uma das
principais bases da engenharia: o projeto. Mas uma flechada de Cupido, cuja ferida, segundo a
mitologia romana, despertava a paixão e o amor da vítima. Uma flechada que não mata, só faz apaixonar,
como deveríamos com mais astúcia nós professores transpassar a mente de nossos alvos. Flechar de
nossos arcos retesados projéteis cheios de veneno de encantamento, para ferir de paixão mentes em
botão, terrenos férteis e plenos de futuros a serem construídos: eis uma boa reflexão.
Pois considero que essa astúcia o professor Nílson deixa transbordar quando fala de projeto –
diretamente em pelo menos dois capítulos –, vazada pela pertinência, pela abordagem e pela
possibilidade de se enxergar a engenharia premiada, mesmo que sem querer.
Na minha trajetória docente, já lecionei disciplinas de Metodologia de projeto mecânico, Teoria de
estruturas, Mecânica dos Sólidos, Confiabilidade estrutural, em meio a tantas outras. Em todas elas
o que mais fiz foi destacar o projeto como fio condutor de narrativas técnicas; como deve mesmo ser.
Aliás, a engenharia – as engenharias – tem no projeto a sua essência. Projeto pensado em suas múltiplas
facetas, bem amplamente falando. Como nos diz o professor Nílson, puxando do fundo do baú, da origem
latina da palavra: projectus, particípio passado de projícere, significando algo como um jato lançado
para a frente. Nos jogamos para a frente, ou lançamos nossos sonhos, nossas ideias, nossas maquinações
lá na frente, e saímos feito crianças ciscando o futuro, correndo para construir a estrada que possa
nos levar até lá para colher o fruto de nossas ilusões.
Projeto. É isso aí. É como engenheiros vivem a construir futuros. Não há engenharia sem projeto, como
não há educação sem projeto. Na verdade, parece que não há vida – humana, que seja a do Sapiens ou a do
Homo deus do Yuval Harari – sem projeto. Essa é uma marca indelével de nossa humanidade. Isso somos
nós.
Ao ler este livro, não imagine o leitor que terá sua alma salva do fogo do inferno. Até porque, como
o texto em pauta procura ensinar, como não podemos viver pelo outro, também não podemos ter projetos
pelo outro. Esta leitura pode nos ajudar a limpar um pouco este meio de campo, baixando a poeira
disforme que costuma pairar imprecisa sobre algumas hostes da engenharia, e principalmente por partes nada
desprezíveis do universo educacional. Mas nenhum livro pode projetar nada por nós. O professor Nílson
é craque nessa interpretação.
Vocês já pensaram em projeto como referência para o futuro, como abertura para o novo, ou na
indelegável ação projetada? Ou na gostosura de pensar a ilusão como algo necessário para a vida,
como se fosse condição para se estar no jogo? Não era bem assim que eu organizava o projeto na minha
cabeça. Se vocês frequentam o mesmo time, mãos à obra!
Todo engenheiro, todo professor de engenharia e de tecnologia devia oferecer o peito aberto para uma
flechada dessas.
Luiz Teixeira do Vale Pereira | Nepet | EMC | CTC | UFSC
A música do universo
Janna Levin | Companhia das Letras | 2016
Resenha | Luiz Teixeira do Vale Pereria | Nepet | EMC | CTC | UFSC
A música do universo
Janna Levin | Companhia das Letras | 2016
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Quem tivesse olhos para ver e ouvidos para ouvir tudo o que nos conta o passado... Passado que se esconde nas dobras de um
tempo fugidio, que passa por nós a galope ligeiro, nos deixando algo como paspalhões que nem sentidos tivéssemos para
capturá-lo, para sugar dele as histórias de que ele se encontra encharcado. O Sol, a Lua, as estrelas, a poeira cósmica –
que desaparecem nos céus urbanos, poluídos por tanta luz, fumaça, prédios e modernidades que desviam as nossas atenções
para pequenas telas reluzentes – deixam paulatinamente o panteão de honra, e passam a compor mesmices enfadonhas que
praticamente só ganham destaque em eventos efêmeros de cliques descartáveis logo ali à frente, na próxima postagem.
Por sorte ainda deixamos germinar alguns nefelibatas – pesquisadores, investigadores, pensadores, filósofos, sonhadores,
poetas, cientistas... – que não se deixam aplacar ante a tirania do óbvio e tentam perscrutar histórias e leituras de que
os céus são plenos.
Ondas gravitacionais?! De onde esse tal de Einstein foi tirar uma ideia dessas? E por qual motivo alguns
loucos-varridos-de-pedra, dezenas de anos depois, foram se atolar na estranha enrascada de querer sentir e mensurar as
tais ondas? E nem dava mesmo para enxergar, porque as ondas luminosas que nos chegam de passados remotíssimos, de sítios
quase além da imaginação humana, após perambular bilhões de anos-luz por esses confins imensuráveis, não mostram muita
coisa nesse quesito.
Mas olhem só: o universo soa, e as suas melodias nos contam muita coisa e nos encantam; essa coisa monstruosa toca feito
um percussionista de primeira linha um tambor revelador de histórias, enviando mensagens que todos deveríamos ouvir.
Como nos apregoam as teorias mais criativas, dois buracos negros bailando copiosamente encenam coreografias autofágicas,
lançando sons que talvez mais pareçam o zumbido de um enxame inteiro de abelhas nervosas, ávidas por nos dizer num
cantochão (de estrelas) monocórdio onde está o mel. Agora mais essa: o universo é musical! Se escutarmos com bastante
cuidado, acabamos descobrindo uma bateria de escola de samba cósmica enviando mensagens bombásticas nas quais quem sabe
revelaremos muito de nós próprios.
Janna Levin botou o dedo na colmeia. E escreveu o texto com mel; muito saboroso, por sinal. Professora de Física e de
Astronomia, participa, conversa e trabalha com astrofísicos de toda sorte que entregaram partes substanciais de suas
vidas a ouvir estrelas – é ou não é coisa de lunático, de nefelibata?
O que mais encanta e convida a releituras neste livro da Janna não é a parte mais técnica – que aliás passa batida em
quase todo o texto, como se ela não nos quisesse chatear com jargões e teorias intrincados e incompreensíveis. Os
intrigantes e teóricos buracos negros participam do discurso, da trama, mas não sugam com suas densidades colossais
as nossas atenções além do necessário para entender as disputas acontecendo. O que mais grita neste texto aparentemente
despretensioso, com cara de crônica, é a ciência em ação. Lendo com os olhos da mente – e ouvindo os sons dos tambores
que a autora toca o tempo todo –, temos oportunidades às pencas para deitar por terra definitivamente a frágil ideia
de uma ciência soberana, autônoma, eterna, infalível, neutra, como se Auguste Comte tivesse vencido e cravado a espada
da sua religião nas nossas mentes.
Quando ela coloca as apostas de Stephen Hawking, as revistas pornográficas, os casamentos destroçados, as disputas de
vaidades, as lutas por verbas, as demissões, os cientistas desfiando palavrões de botequim, as noites em claro, os
desânimos inevitáveis, os programas naufragando, as euforias por sucessos pessoais ou de grupos, a caça ao prêmio Nobel,
só dá para enxergar uma coisa: Bingo! Ali está a ciência real se fazendo no dia a dia.
O que aparece ali não é a ciência de revista de divulgação científica, não é a ciência asséptica de livro-texto escolar,
não é a ciência de telejornal de fim de noite. Não é a ciência de almanaque, do Google, das redes sociais, de discursos
fáceis e inconsequentes postados no Youtube, de palestras de economistas detentores da verdade. É a ciência tal como
ela é de fato. É a ciência, digamos assim, “de carne e osso”. É a ciência como atividade humana, e não como um arremedo
fantasioso de algo sobrenatural, que nos teria sido dado pronto e acabado, e que por isso devêssemos venerá-la,
acendendo velas de promessa ou respeito. E essa revelação é imperdível! É o dedo na colmeia, com as abelhas lá dentro.
É um texto estimulante, escrito pela talvez mais descontraída astrofísica teórica da atualidade, que tem a verve da boa
prosa e que também transita por outras literaturas. Numa linguagem fácil, coloquial, fluida, instigante feito um ímã,
Janna nos fala de muitos eventos que parece que já conhecemos no nosso dia a dia, ali, acontecendo bem embaixo dos nossos
narizes.
Eu reputo ser um livro imperdível para quem desconfia de suas ideias sobre ciência – herdadas de dicionários –, e que
por isso acha que ciência é porque é a dona da verdade eterna e imaculável e não se fala mais nisso!
Mas também – talvez até mais que imperdível – é um livro necessário para quem nem desconfiava dessa possibilidade de
ciência como atividade humana. Porque a ciência – melhor seria dizer “as ciências” – é uma atividade humana como outra
atividade qualquer, mas de um tipo muito, muito especial, terreno fértil para a dúvida, onde o sentido e a interpretação
mais óbvios devem ser vistos com desconfiança criadora, onde não se deve ter medo de ousar, onde pouco espaço sobra
para revelações divinatórias (quem sabe demiúrgicas) solitárias, onde o discurso de autoridade ensimesmada costuma
ter pernas curtas.
Olhos e ouvidos atentos, ao sorvermos o livro de Janna Levin podemos ter oportunidades de sobra para interpretarmos a
ciência de forma mais alvissareira, mais realista, mais compatível com a grandiosidade e a estupenda importância desse
fantástico empreendimento humano.
Luiz Teixeira do Vale Pereira | Nepet | EMC | CTC | UFSC
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